O edital da licitação deve deixar explícito se o critério de aceitabilidade previsto no art. 59, inciso III, da Lei 14.133/2021 aplica-se somente ao preço global da proposta ou se, também, ao preço unitário dos itens. TCU – Acórdão nº 2190/2024 – Plenário, Relator Augusto Nardes, Data sessão: 16/10/2024
O critério de aceitabilidade define se uma proposta de licitação é considerada válida ou não, levando em conta aspectos definidos na Lei nº 14.133/2021:
Art. 59. Serão desclassificadas as propostas que:
I – contiverem vícios insanáveis;
II – não obedecerem às especificações técnicas pormenorizadas no edital;
III – apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação;
IV – não tiverem sua exequibilidade demonstrada, quando exigido pela Administração;
V – apresentarem desconformidade com quaisquer outras exigências do edital, desde que insanável.
A questão em análise no acórdão está relacionada com a interpretação do inciso III (apresentarem preços inexequíveis ou permanecerem acima do orçamento estimado para a contratação) que, por si só, pode gerar dúvidas se o critério se aplica ao preço total da proposta ou também aos preços individuais de cada item de um grupo. A falta de clareza nesse ponto pode gerar controvérsias e prejudicar a lisura do processo licitatório.
A falta de especificação explícita no edital sobre a abrangência do critério de aceitabilidade — se aplicável ao preço global ou também ao preço unitário do grupo — pode gerar insegurança jurídica para os licitantes, que podem interpretar o edital de forma equivocada, acarretando prejuízos ou impugnações.
- Onde ocorreu o caso
No caso concreto, o processo visava à contratação de um sistema de gerenciamento de ciclo de vida de produto (PLM) para desenvolvimento de meios navais. O responsável julgado foi o pregoeiro do Centro de Intendência Tecnológico da Marinha em São Paulo.
O valor estimado da licitação não foi divulgado (orçamento sigiloso) e o critério de julgamento adotado foi o menor preço por grupo.
- O que foi debatido
O principal argumento da representação era a desclassificação de uma proposta por ter valores unitários acima do estimado, mesmo com o menor preço global. A defesa alegava que a desclassificação não considerou a possibilidade de negociação e se baseou em acórdãos do TCU com fatos diferentes. Contudo, tais argumentos não foram acolhidos, conforme relatado pelo TCU:
“os valores apresentados para os itens 1 e 2 estarem acima dos estimados”, mesmo ela tendo oferecido o menor preço global. Sua desclassificação teria, assim, ocorrido “sem considerar a possibilidade de negociação e fundamentada em acórdãos do TCU que tratariam de situações fáticas distintas”.
Em sua instrução, a unidade técnica esclareceu que, durante a realização do certame, o pregoeiro informara à representante que os valores dos itens 1 e 2 estavam acima dos orçados pela Administração e questionara se a empresa teria condições de ajustá-los “de acordo com o limite estimado”. Na proposta da representante, os itens 1 e 2 totalizaram, respectivamente, R$ 11.800.000,00 e R$ 3.325.000,00, enquanto os preços de referência da Administração foram R$ 10.215.207,77 e R$ 1.800.000,00.
A empresa respondera que poderia apenas “realocar os valores na proposta de preços, sem alteração no preço final”. Conforme apurado pela unidade instrutiva, mesmo após negociação, os preços unitários apresentados pela representante continuaram superiores aos estimados.
Concluiu então que fora, sim, oportunizado à empresa o envio de nova proposta de preços com os valores corrigidos, em conformidade com a jurisprudência do TCU, que é no sentido de que erros no preenchimento da planilha de preços unitários não são motivo para a desclassificação de licitantes, quando a planilha puder ser ajustada sem majoração do preço global ofertado.
O TCU concluiu que a empresa teve oportunidade de ajustar os valores na fase de negociação da proposta, seguindo a jurisprudência do Tribunal, que permite ajustes em planilhas de preços unitários sem alteração no preço global. Contudo, nesse momento, a empresa não aceitou reduzir seus preços unitários ao estimado, o que resultou na sua desclassificação.
A empresa representante ainda argumentou que apresentou posteriormente, na fase recursal, uma proposta ajustada. No entanto, essa nova proposta foi corretamente considerada intempestiva.
- Resultado do caso
Não houve anulação do Pregão Eletrônico. Contudo, como o edital não deixou explícito se o critério de aceitabilidade se aplicava ao preço global ou unitário, o TCU determinou que o Centro de Intendência Tecnológico da Marinha em São Paulo fosse cientificado dessa impropriedade, para evitar ocorrências semelhantes em futuros certames. Não houve penalidades individuais aplicadas aos responsáveis pelo processo licitatório. A medida tomada foi exclusivamente de caráter preventivo.