Constatado que lance manifestamente inexequível possa, durante a disputa, comprometer, restringir ou frustrar a competitividade do processo licitatório, o agente de contratação pode excluí-lo, de forma a resguardar a Administração de eventual comprometimento da busca pela proposta mais vantajosa (art. 21, § 4º, da IN Seges/ME 73/2022).
TCU – Acórdão nº 948/2024 – Plenário, Relator Jorge Oliveira, Data sessão: 15/05/2024
Um lance inexequível é uma proposta de preço tão baixa que demonstra impossibilidade de execução do serviço ou fornecimento do bem pelo licitante, levantando suspeitas quanto à sua viabilidade e podendo comprometer a lisura do processo competitivo. A presença desses lances pode prejudicar a concorrência justa, já que outros participantes podem ser desencorajados a participar ou a apresentar propostas mais agressivas, caso a inexequibilidade não seja devidamente tratada.
Nesse sentido, a legislação permite que o agente de contratações desclassifique propostas manifestamente inexequíveis ainda que durante a fase de disputa. Nesse sentido:
IN Seges/ME 73/2022, art. 21, § 4º, da, O agente de contratação ou a comissão de contratação, quando o substituir, poderá, durante a disputa, como medida excepcional, excluir a proposta ou o lance que possa comprometer, restringir ou frustrar o caráter competitivo do processo licitatório, mediante comunicação eletrônica automática via sistema.
No entanto, a análise de exequibilidade de uma proposta não é tarefa fácil, em vista que diversos motivos podem conduzir um licitante a apresentar proposta abaixo da média do mercado. Portanto a exclusão deve ser uma medida excepcional, quando existir o potencial de prejudicar a competitividade do certame.
Modo de disputa e possibilidade de exclusão de lances inexequíveis
A escolha do modo de disputa impacta diretamente a dinâmica da concorrência entre os licitantes, influenciando aspectos como a estratégia de apresentação de preços e a possibilidade de revisão de lances. Além disso, a forma como os lances são conduzidos pode afetar a identificação e exclusão de propostas inexequíveis, tornando essa análise uma etapa crucial para evitar distorções na concorrência.

A análise de inexequibilidade dos lances apresenta peculiaridades específicas conforme o modo de disputa adotado no certame licitatório. No modo aberto, a verificação pode ocorrer em tempo real, permitindo aos licitantes a readequação imediata de suas propostas e minimizando o impacto na competitividade do certame. Por sua vez, no modo fechado, a análise posterior à abertura das propostas possibilita uma avaliação mais detalhada, mediante a possibilidade de realização de diligências antes da eventual desclassificação.
No que concerne ao modo aberto e fechado, evidencia-se especial preocupação quanto à não exclusão de lance inexequível na fase aberta, dado que tal situação permite a participação indevida na fase fechada, prejudicando substancialmente a competitividade ao impedir que outros licitantes com propostas exequíveis participem da etapa de lances fechados. Esta circunstância compromete a eficiência do certame e tem maior impacto na competitividade.
Quanto ao modo fechado e aberto, a análise de inexequibilidade na primeira fase também assume relevância estratégica, pois a classificação inicial determinará os participantes da fase de disputa aberta. A não exclusão de propostas inexequíveis neste momento pode resultar na classificação inadequada de licitantes para a fase competitiva, potencialmente excluindo propostas exequíveis que poderiam oferecer lances mais vantajosos para a Administração durante a etapa de disputa aberta.
- Onde ocorreu o caso
O órgão julgado foi o Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (TRT-3), em Minas Gerais. Houve uma representação no Tribunal de Contas da União (TCU), visava analisar irregularidades no Pregão Eletrônico 35/2023, que tinha como objetivo contratar serviço de segurança patrimonial. Os responsáveis julgados foram a pregoeira do TRT-3 e a empresa representante que apresentou o lance inexequível.
- O que foi debatido?
O principal ponto analisado foi a não exclusão de um lance manifestamente inexequível pela pregoeira. A representante argumentou falha no sistema Compras.gov.br, impossibilitando a exclusão do lance dentro do prazo.
Ocorre que o SERPRO apresentou relatório ao processo indicando que não houve falhas no sistema, e ainda que:
caso a licitante digite lance inexequível, o sistema disponibiliza tela de confirmação com o seguinte texto: ‘Senhor fornecedor, o valor informado para seu lance está inferior a 50% do valor estimado pelo órgão para este item, deseja confirmar?’. Se o valor for confirmado, o fornecedor ainda dispõe da possibilidade de excluir o lance nos quinze segundos subsequentes, conforme estabelecido no art. 21, § 3º, da IN Seges/ME 73/2022.
O relator e a unidade técnica concluíram que não houve falha sistêmica, sendo a responsabilidade da licitante. A não exclusão, apesar de questionada, foi considerada não comprometedora à competitividade do certame, visto que o modo de disputa era apenas aberto, o número de lances posteriores foi elevado e a proposta final foi vantajosa para o TRT-3, com 14% de economicidade em comparação ao valor estimado.
Por outro lado, antes de receber a o relatório do SERPRO com a confirmação da inexistência de falha no sistema, a pregoeira havia divulgado a decisão de revogar a licitação, abrindo prazo para recurso contra a revogação, nos termos do art. 165, d da Lei 14.133/21.
Nesse momento, as empresas interessadas apresentaram recurso contra a revogação, e a primeira colocada (com proposta inexequível) juntou ao sistema suas contrarrazões). Nesse momento, a pregoeira, já com acesso ao relatório do SERPRO, aceitou o recurso, cancelando a revogação da licitação.
No entanto, a decisão do recurso não analisou os argumentos constantes nas contrarrazões. Foi debatida a não análise das contrarrazões da representante, violando o contraditório e a ampla defesa. Embora não houvesse dolo ou má-fé, a falta de análise tempestiva dessas contrarrazões resultou na anulação do certame.
- Resultado do caso
O TCU determinou ao TRT-3 a anulação do Pregão Eletrônico 35/2023 devido à violação do contraditório e da ampla defesa, por não analisar as contrarrazões da representante. Não houve penalidades individuais para os responsáveis pelo processo licitatório, apenas a anulação do certame. A decisão considerou que apesar de a pregoeira não ter excluído o lance inexequível, não foi caracterizada sua responsabilização.